COVID19 - Nem Tudo Foi Mau

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"Não posso dizer que os teus planos sejam absurdos, se nos esquecermos do absurdo da situação em si mesma."

"Vê o quadro! Não te fixes na moldura. O quadro é o amor. E o amor nada tem de absurdo. Tudo o há à volta é acessório. Mas se da tua parte não há amor, então sou eu mesmo que te peço que não venhas. Dedica-te à tua vida e a viver o melhor possível. Sempre terás o teu irmão que te adora por cima de todas as coisas. Refiro-me ao teu irmão. Não ao homem, porque esse sofrerá em silêncio, mas jamais te incomodará com propostas que não desejas ouvir. Só te peço que nesse caso não me provoques com beijos como o de hoje, nem que me apalpes os abdominais e os peitorais, como fazes de vez em quando, nem nada que estimule desejos que devem estar reprimidos."

"És um Homem com maiúscula Leo. Um cavalheiro onde os haja. És nobre. Prometo que vou pensar. Dá-me tempo."

"Todo o que necessitares. Necessito-te junto a mim. Mas ainda necessito mais que não seja pão para hoje e fome para amanhã. Não te poder ter é tristíssimo. Perder-te seria catastrófico. Poderia até suicidar-me. E não falo por falar."

"Leo..." Começou a chorar. "Tenho tanta necessidade de ti... Em todos os sentidos. Mas os obstáculos são enormes."

"Sandra. Amas-me?"

"Desde jovenzinha. Mas eras inalcansável e aprendi a controlar as minhas emoções em tudo o que te dizia respeito. Casei-me precipitadamente com aquele selvagem, para tentar tirar-te da minha cabeça e vê o resultado. Mas começo agora a ver as coisas desde outro ângulo."

"Entendo. Não temos pressa."

"És um querido! Mas com tudo isto ao mesmo tempo... A tua mudança de atitude em relação a mim, a merda do vírus, imaginar a reação dos velhos e dos nossos amigos... Não estou a conseguir assimilá-lo. Não consigo encontrar palavras..."

"Sim eu sei. Não é fácil e a pressão da sociedade... Já sabes. Bem vou pôr o DVD."

O documentário começou e eu sentei-me no sofá.

Sandra deitou-se ao comprido no sofá, à minha direita, com a cabeça nas minhas pernas e eu acariciava-lhe o cabelo. Ela de vez em quando dava-me beijinhos na mão.

"Que tristeza Leo. É um tributo a ela. Quer dizer que morreu..."

"Sim. Vais vê-los juntos e felizes viajando no seu todoterreno Mercedes, durante várias fases da vida deles, durante os mais de 22 anos em que viajaram juntos. Quando ela morreu, ele decidiu continuar sozinho, em honra da sua memória. Pelo menos durante a última viagem que ambos tinham planeado. Nunca se preocuparam em casar-se, mas ao final decidiram fazê-lo, quando ela estava no leito de morte."

"Que lindo Leo. Parece uma novela romântica." Sandra chorava de emoção.

"Diz que a sente ao seu lado enquanto conduz. Vai falando com ela e de vez em quando chora desconsolado. A Mercedes continua a financiá-lo." Sandra não parava de chorar e eu também.

"Gostavas de ter um amor assim Leo?"

"Oh sim! Definitivamente! E vejo-o viável. Desde que seja cont... Tu sabes com quem. E tu?"

"Eu também! Definitivamente! Abraça-me Leo."

Estivemos uns minutos abraçados em silêncio.

Vimos o documentário até ao final. Foi lindo e choramos bastante, abraçados como dois amigos, sem beijos nem carícias lúbricas, o que nos relaxou um pouco.

"E que é feito dele agora?"

"Não sei e não quero ir à Internet indagar isso. Para não ter algum desgosto."

"Leo."

"Escuto-te."

"Acabo de encontrar algo positivo neste maldito vírus."

"Conta-me."

"Não sei como é que isto irá acabar, mas é graças a este confinamento que encontramos uma razão para abrirmos os nossos corações. Não quero chegar a velha com a pergunta sem resposta do que poderiam ter sido as nossas vidas. Se decidirmos que não, estaremos frustrados, mas pelo menos não viveremos na incerteza. Se decidirmos que sim, haja o que houver estaremos cada um com o seu amor, os dois em bloco, enfrentando-nos ao que faça falta."

"Vou fazer um café. Outra tília?"

"Não. Um Lagavulin 16 com quatro uvas congeladas, e uns frutos secos."

Uvas congeladas. É o que sempre utilizamos em vez de gelo, para arrefecer as bebidas alcoólicas sem lhes misturar água.

"Pois bebo o mesmo contigo, mas a temperatura ambiente, para acompanhar o café."

Sandra acabou por beber três whiskys e não bebeu mais porque não a deixei.

Ficou meio grogue, começou a pôr-se demasiado meiga, eu controlei-a e acabou por adormecer.

Levei-a para o quarto despi-a, vesti-lhe uma camisa de dormir e deitei-me ao lado, até ela adormecer. Depois fui para o meu.

"LEO! Leooooo!"

Olhei para o telemóvel. Cinco e vinte e dois da manhã.

Corri para o quarto dela, pensando que era um pesadelo.

"Mas... Como pudeste? Estou sem roupa interior por baixo do camisão."

"Sim claro."

"Viste-me nua!"

"E és ainda mais linda do que eu te imaginava."

"Pervertido! Que é que tu me fizeste?"

"Desnudei-te, vesti-te o camisão, meti-te na cama e quando tive a certeza de que estavas profundamente adormecida, fui para o meu quarto."

"Fi... Fizeste-me...? Que é que tu me fizeste?"

Fulminava-me com os olhos.

"Na totalidade dos anos que levas neste planeta, desde que nasceste até hoje, as únicas coisas que te fiz foram proteger-te, cuidar-te e amar-te profundamente, desde o tempo em que eras a minha linda irmã adolescente... Sofrendo a minha frustração em silêncio! Jamais teria sido capaz de tocar-te sem o teu consentimento. Quando te tirei a roupa, não te toquei em nenhuma parte proibida do teu corpo. Apenas olhei e adorei tudo o que vi. Confesso que te contemplei durante mais tempo do que o necessário, mas só isso. Tinhas obrigação de sabê-lo. Só a dúvida é um insulto!"

"Ai meu Deus! Que estúpida sou! Perdoa-me. Foi uma reação da ressaca."

"Uma reação de total desconfiança. Com ou sem ressaca, estou muito ofendido. Vou deitar-me."

Virei costas e saí.

"Leo! Por favor vem."

"Não me apetece. Vê se dormes."

Disse-lhe com dureza.

Saí para o meu quarto.

Quando estava a dormir profundamente, acordei com ela ao meu lado, completamente nua e abraçada a mim.

Dormia como um bébé. Cheirava divinamente. Foi uma das sensações mais maravilhosas, que sempre recordarei com imensa saudade.

Saí da cama com cuidado para não a despertar, fui ao quarto dela buscar o edredon e a almofada dela. Deitei-me ao comprido no sofá grande da sala, enrolei-me no edredon e adormeci.

"Leo..."

Sussurrou-me ao ouvido com uma voz sensual.

"Rrbnzrrm."

Murmurei de olhos fechados simulando que dormia.

"Leo..."

Voltou a sussurrar, colando os lábios aos meus.

"Ffbbnmm..."

Continuei a simular que resmungava adormecido e virei-me de costas.

"LEO!"

Agora quase gritava.

"Han? Que horas são?"

Estava completamente nua.

"Dez e trinta e seis."

"Faz-me um favor Sandra. Vai para o meu quarto e deita-te. Eu fico aqui e quero estar sozinho."

Felizmente era domingo.

"Não estejas zangado comigo. Porque é que vieste para aqui? Não gostaste da supresa que te quis fazer?"

"Francamente não."

"Só queria comunicar-te a minha decisão de aceitar a tua proposta e fazer amor contigo para celebrarmos o início da nossa nova vida como casal."

Começou a fazer beicinho e a choramingar.

Decididamente, ao longo dos anos, eu tinha-a estragado com excesso de mimo.

"Não. Assim não. Não sei se ainda estás com os copos, ou na ressaca. Depois do que me disseste esta madrugada, provavelmente o próximo passo é dizeres que me aproveitei do teu estado para abusar de ti."

"Não Leo! Estou completamente sóbria. Vem fazer amor comigo!"

"Não. Há decisões que não quero que tomes em quente. Eu tenho tudo claríssimo desde há muitos anos, mas tu não! Quero que tenhas tempo de pensar, em vez de fazeres a primeira coisa que te vem à cabeça. Ducha-te e veste-te, que eu vou fazer o mesmo, na outra casa de banho."

"Sandra! Vem."

Chamei-a enquanto fazia os pequenos almoços.

Apareceu com uma expressão muito triste. Fingi que não me apercebera.

"Estrelados a ou mexidos?"

"Só café com leite, duas torradas e duas fatias de bacon frito. Bem estaladiço."

Tomamos o pequeno almoço em silêncio.

Depois Sandra foi para o sofá com o Kindle que eu lhe oferecera no seu penúltimo aniversário.

"Que estás a ler?"

"Um thriller sueco. 'Segredos imperfeitos'. O primeiro de uma série de seis livros. A série Bergman."

"Nunca ouvi falar... É bom?"

"Ainda não sei. Estou a começar agora. Mas deve ser bom. Está escrito por dois autores e um deles foi o guionista da série de televisão Bron/Broen - A ponte'. Por isso deve ser bom, mas muito violento."

"Como todos os thrillers nórdicos. Respondi. Tenho saudades de ouvir a Sofia Helin: 'Saga Norén, Polícia de Malmö'. Tão carismática como Sean Connery com o seu famoso 'My name is Bond... James Bond'."

"Sim, a Sofia Helin é uma atriz fantástica e nessa série esteve magistral, interpretando a Saga Norén, do departamento de homicídios de Malmö." Disse Sandra.

Calámo-nos e gerou-se entre nós um silêncio incómodo.

Fui eu que quebrei o silêncio.

"Estás zangada comigo?"

"Não estou."

Respondeu secamente.

"A pergunta era retórica. Conheço-te."

"Estou triste e dececionada. Já não sei se me amas tanto como dizes. Ia entregar-me a ti cheia de ilusões e recusaste-me. Queria sentir-te dentro de mim por primeira vez e saíste da cama. Apareci-te nua aqui e expulsaste-me. Nunca me senti tão desprezada e humilhada."

"Recusaste-me... Expulsaste-me... Desprezada... Humilhada... Não achas que são palavras demasiado fortes? Deves compreender que uma mudança de atitude tão radical não se deve tomar sob os efeitos do álcool, nem na ressaca."

"Sabes que não sou uma irresponsável. Já tinha tomado a decisão antes de beber e ia dizer-te isso quando te pedi que me desses um whisky. Depois faltou-me a coragem e tomei mais um whisky. E outro... e sem me dar conta embebedei-me. Quantas vezes me viste com os copos?"

"A verdade é que nenhuma. Mais uma razão para ser prudente. Sandra, se esta noite ainda estiveres tão segura de ti, teremos a primeira das nossas noites juntos. Parece-te bem?"

"Não, mas aceito as tuas exigências."

"Propões algo diferente?"

"Não. Faremos como dizes."

Entretanto entrou-lhe uma chamada pelo Skype.

"Oh não. A Nuria! Deixa-me atender e não faças ruido." Pôs o telefone em mãos livres.

"Olá querida como estás?"

"Sandra querida, como estão vocês?"

"No paraíso! Com quem podia estar melhor que com o meu irmão preferido?"

"Que parva! Só tens um!"

"Mas sempre digo isso. Quando aquele animal me bateu, quem me foi resgatar? Quem levou uma navalhada para me defender? Quem seria capaz de dar a vida por mim? Olha os meus pais só me disseram que chamasse a polícia."

"Sim o Leo é o máximo. Posso falar com ele?"

Sandra olhou para mim. Abanei a cabeça e fiz o gesto de dormir.

"Podes, mas mais tarde. Deve ter-se deitado tarde, porque me deixou um papel na cozinha a dizer que não o despertasse antes do almoço. Agora são onze e quarenta e três, por isso não posso chamá-lo. Ontem, apesar de ser sábado, trabalhou muito mais que as habituais oito horas num novo projeto, para um cliente canadiano da provícia de Alberta e deve estar bastante cansado."

"O Leo é um génio! Como o admiro..."

"Assim é o meu irmão!"

"E como é que vocês estão a levar o confinamento?"

"Bem. Jogamos xadrês, lemos, vemos séries, fazemos ginástica, respeitamos o espaço um do outro e as respetivas privacidades, por isso o ambiente é respirável."

"Sim e ele adora-te."

"Adoramo-nos um ao outro. Ter um irmão assim não tem preço. Sempre foi assim. Quando tinha cinco anos a minha mãe à vezes autorizava-o a dar-me o biberon e era ele que lhe pedia. Eu não me lembro, mas sei que era assim. Lembro-me dele desde que tenho uso de razão e sempre me senti protegida e mimada por ele. E quando o teu irmão quase se deixa matar para te defender... Só podes adorá-lo! Deves lembrar-te de que no instituto ninguém se atrevia a meter-se comigo, desde que ele bateu no Norberto... Ele é quatro anos mais velho que eu e mesmo estando na universidade, vinha ao colégio buscar-me muitas vezes, para que se visse que eu não estava desprotegida. Nessa época, também era ele que ia às reuniões com os professores, porque os meus pais estavam-se nas tintas para tudo. Eu costumo dizer que ele para mim é uma espécie de pai mais novo."

"Sim. Não me estranha que tenhas preferido estar aí com ele. E que é feito da Celi?"

"Na verdade não sei bem... Só sei que ontem telefonou e por respeito saí da sala. Respeito muito a privacidade dele."

"Disseram-me que eles cortaram. É verdade?"

"Desconheço... O Leo não me disse nada, nem é assunto que me diga respeito."

"Nem sentes curiosidade?"

"Nenhuma. Nesse aspeto sou muito pouco feminina. Ouço o que me contam, não pergunto o que não devo e não falo da vida dos demais. Assim não se geram malentendidos."

"Quer dizer que se soubesses algo não me contarias?"

"Obviamente!"

"Posso chamar sobre as três?" Sandra olhou para mim, e eu assenti.

"Podes. Acho que é uma boa hora."

"Ainda bem. Para mim é muito importante."

"Muito bem. Então até logo às três."

"Não me perguntas porquê?"

"Não. Como te disse, sou muito respeitadora da privacidade das pessoas e se tens que falar com ele, eu não tenho porque saber os motivos. Detesto gente bilhardeira e sou a primeira pessoa a quem aplico essa regra. Adeus. Um beijo."

Olhou para mim pondo os olhos em branco.

Sandra desligou e olhámo-nos.

"Que será que ela quer?"

"Nunca te disse nada, mas ela leva anos apaixonada por ti."

"É brincadeira não?" Perguntei visivelmente contrariado.

"Nunca falei tão a sério."

"Bem com isto do confinamento, pelo menos não vai tentar meter-se aqui em casa."

"Se calhar vai-se declarar." Riu-se

"Não digas disparates."

"Não gostas dela?"

"De entre as tuas amigas é das mais aceitáveis, mas nunca me interessou para nada. Vê se entendes que neste mundo só há uma mulher que me interessa! E sabes quem é."

"Acho-a bastante gira. Tu não?"

"Sandra! Sei lá! Feia não é, mas quê?"

Almoçamos. Sandra aparentemente estava mais calma.

Às três em ponto veio a chamada do Skype.

"Simulas que sais da sala, depois sem ruido entras e fechas a porta de forma que ela ouça, sentas-te ali em frente deixo isto em mãos livres, mas ela não pode desconfiar."

"Olá de novo Nuria. Sim passo-te com ele."

"Leo! Como estás que não há quem te veja!"

"Olá Nuria. Eu bem, apesar de ter que aturar a chata da tua amiga e tu?"

Pisquei-lhe o olho e Sandra sorriu em silêncio.

"Estaria muito melhor se estivesses aqui comigo."

"Hmmm... Disse-me a Sandra queres falar comigo...?"

"Podemos falar em privado?"

"Claro. Um momento. Sandra podes deixar-me sozinho uns minutos?

Claro que sim. Chama-me quando terminares." Disse em tom casual.

Falou alto para a outra ouvir.

Levantou-se, dirigiu-se à porta e saiu para o corredor, onde se descalçou. Voltou a entrar sem ruido e fechou a porta de modo a que a outra ouvisse.

"Já estamos sós Nuria. Que me queres dizer com tanto secretismo?"

"Leo... Esta coisa do virus e do confinamento tem-me desesperada. Agora o Skype é o mais parecido com falar pessoalmente, senão estariamos a falar cara a cara. Podemos ligar as câmaras?"

"Não. Estou todo despenteado e com barba de três dias."

"Não me importa nada isso. Quero ver-te."

"Acredito, mas importa-me a mim. Continuamos só por voz."

"Bem... Como quiseres."

Notava-se bem que estava dececionada.

"Tu estás com os teus pais ou sozinha?"

"Com eles, mas é um desespero. Discutem, ele fuma e às vezes nem abre a janela..."

"Com os meus é mais ou menos o mesmo, mas pelo menos nenhum deles fuma. A Sandra veio para aqui comigo, porque não os aguentava."

"Não sabes o que eu dava para estar aí contigo... Bem com vocês."

"Tens que encontrar um modo de te entreteres, com eles ou sozinha."

"Haveria alguma possibilidade de eu ir para aí com vocês?"

"Não Nuria. Sinto muito, mas isso não pode ser. Para já, nesta fase do confinamento, é ilegal."

"Ora ora! Há tanta coisa ilegal que se faz!"

"Pois Nuria, mas a Sandra e eu somos a simbiose perfeita. Nenhum de nós invade o espaço do outro, estamos tão habituados a viver juntos que às vezes nem precisamos de falar. Uma terceira pessoa ia desiquilibrar a harmonia em que vivemos. Não é por seres tu, por isso não te ofendas."

"Como vão as coisa com a Celi?"

"Não vão."

"Não achas que nos podíamos conhecer melhor? Sempre te achei o máximo."

"Nós conhecemo-nos bem Nuria."

"Pensei noutra coisa. Podíamos tentar conhecer-nos melhor, digamos... a outro nível, se é que me faço entender."

"Não estou aberto a outros tipos de relacionamento. Estou traumatizado. Depois de várias tentativas catastróficas desisti e é definitivo. Por outro lado a Sandra também está como eu. O ex dela..."

"Sim eu sei. Teve muito azar com o homem que lhe tocou. E felizmente teve-te a ti para a defenderes. Quase deste a vida por ela."

"A Sandra é a única pessoa neste mundo, por quem eu daria a vida! Olha Nuria, eu necessito uma companhia feminina, mas não ao nível a que tu pretendes. A Sandra necessita o mesmo que eu, mas também não quer nada que tenha que ver com relações amorosas. Não quer viver com nenhum homem que lhe solicite... outras coisas. Sentimo-nos completamente seguros um com o outro a esse respeito. Já vês... Somos irmãos. Adoramos estar juntos, desde o tempo em que ela era bebé. Levamos pouco menos de três décadas juntos e é assim que nos sentimos bem. Como dois amigos. Acreditas se te disser que temos dias em que só nos vemos ao pequeno almoço?"

"A sério?"

"Não é frequente, mas sim. Não precisamos de nos ver para nos sentirmos acompanhados. Ela sente-se segura e eu sei que está mesmo segura. Se não necessita nada, não invade o meu espaço e eu faço o mesmo com ela. Mas três vezes por semana fazemos ginástica juntos durante uma hora em frente de um monitor virtual. Inclui exercícios de pilates e de yoga. Peço o teu email à Sandra quando acabarmos de falar, envio-te um link e baixas o programa desde o meu Google Drive. É muito variado e por isso não se torna monótono."

"Que estranho estar na mesma casa e não se verem."

"Não te esqueças de que eu trabalho todos os dias úteis desde casa, durante oito horas, às vezes mais, com uma hora de intervalo para o almoço. De qualquer forma, o habitual é que tomemos juntos pelo menos uma refeição grande por dia e às vezes cozinhamos juntos. Também jogamos xadrêz de vez em quando e vemos algumas séries juntos na Netflix. Temos gostos semelhantes. Para que entendas, não pomos uma parede ao meio, mas não nos interferimos no mau sentido da palavra."

"Sim, entendo. E quando acabar o confinamento?"

"Já falamos nisso e decidimos que vamos continuar a viver da mesma forma. Estou a ajudá-la a preparar-se para trabalhar online, dando aulas de lingua espanhola e de literatura. O mundo não voltará a ser como era. O ensino online a partir de agora vai ser bastante usado e vai ser bem pago. Teremos gabinetes separados, sem nos incomodarmos um ao outro e sem ruido. Somos dois irmão que se levam muito bem e a casa é enorme. Na verdade são dois apartamentos T4 pegados um ao outro, mas completamente separados, continuam a ter cada um a sua porta de entrada e não se comunicam interiormente. Ou seja, somos vizinhos porta com porta. Ah... construi-lhe um sistema que lhe permite pedir-me ajuda com tão só pulsar um botão.

Normalmente, agora no confinamento, estamos na minha casa todo o dia, mas à noite ela vai dormir na sua casa. Ambos temos a chave da casa do outro, mas pela posição do tapete de entrada, sabemos se podemos entrar ou não. Se está encostado à direita é via livre, Se está encostado à esquerda, trânsito proibido."

"Mas Leo... Os homens necessitam também... outras coisas, por dizê-lo de alguma maneira. Comigo não te faltaria de nada. Não podemos ao menos experimentar?"